Óculos de realidade virtual, interação pelo metaverso e adesão às últimas tecnologias.
Frequentemente associados ao universo dos games, esses fatores receberam um novo significado no Hospital das Clínicas (HC) de Ribeirão Preto (SP): a utilização na separação das gêmeas siamesas Allana e Mariah, de 1 ano e 10 meses, que nasceram unidas pela cabeça.
As irmãs são acompanhadas desde a gestação pela equipe médica do hospital. No sábado (19), elas foram submetidas à segunda das quatro cirurgias previstas até a separação. (veja abaixo)
Algumas das tecnologias empregadas na ocasião, como impressão de peças 3D e neuronavegação, marcam o novo atendimento.
Médicos que atuam no caso Allana-Mariah detalharam a característica de cada uma dessas tecnologias. Confira:
Metaverso
O médico Hermes Prado afirma que a equipe começou a utilizar os óculos de realidade virtual em 2021.
A intenção, segundo Prado, foi reproduzir imagens dos cérebros em tamanho real para obter maior precisão antes da primeira cirurgia.
Durante o pré-operatório, a equipe também recorreu ao metaverso, realidade aumentada com a qual é possível vivenciar simulações virtuais.
“Nos reuníamos em salas do metaverso e preparávamos cada passo na sala de cirurgia. Outra praticidade era que não precisávamos estar na mesma cidade. Teve médico que esteve em Campinas (SP) e se preparou com a gente”, pontua.
As crianças passaram pela primeira cirurgia em agosto deste ano.
‘GPS do cérebro’
O neurocirurgião Hélio Rubens Machado, chefe do setor de neurocirurgia do HC, explica que o neuronavegador é um equipamento que auxilia o médico a localizar estruturas do crânio como se fosse um “GPS”.
A tecnologia já havia sido utilizada durante a separação das gêmeas Maria Ysabelle e Maria Ysadora, do Ceará (CE).
“A neuronavegação é baseada em imagens de ressonância magnética, obtidas em um único plano. Os cirurgiões podem, antes de fazerem a cirurgia, transpor o que foi planejado para a realidade virtual para o campo operatório. Isso é um avanço inestimável, pois diminui o risco”, ressalta.
Impressão 3D
O uso de figuras tridimensionais também não é uma novidade nesse novo caso.
Ainda de acordo com Machado, a utilização de impressoras 3D tem sido crucial para obtenção de figuras que remetam aos crânios das gêmeas.
“O modelo cerâmico mostra somente a área que vamos trabalhar. Dá detalhes das pequenas veias onde vamos seccionar. Esse modelo, de cerâmica, tem a enorme vantagem de podermos separá-los. Já o modelo de acrílico é o que podemos pegar para entender o que acontece dentro do crânio”, afirma.
Celulas-tronco?
Segundo o cirurgião plástico Jayme Farina Júnior, a equipe tem analisado o uso de células-tronco para a reconstrução dos crânios das gêmeas. O procedimento é conhecido como cranioplastia.
A utilização pode acontecer após a quarta e última neurocirurgia antes da separação das irmãs, prevista para o próximo ano.
Na cranioplastia, a cabeça de uma criança é coberta pelo pedaço de pele doado pela outra. O objetivo da equipe é melhorar a qualidade do procedimento com as células-tronco.
‘Dias cada vez mais próximos’
A segunda cirurgia para separação das irmãs Allana e Mariah durou nove horas e foi concluído no sábado (19). Na ocasião, estiveram presentes mais de 40 profissionais de saúde.
De acordo com a mãe das crianças, Talita Francisco Ventura Sestari, as gêmeas se recuperam na Unidade de Terapia Intensiva do HC Infantil.
“As bebês, graças a Deus, estão tendo uma recuperação maravilhosa. Elas já estão conversando, brincando e comendo. Nem parece que fizeram uma cirurgia recentemente”, conta.
Talita também revelou expectativa para a separação das filhas, que devem passar por mais duas neurocirurgias antes do quinto e último procedimento, a cranioplastia.
“A expectativa é muito grande de logo pegar elas separadas. Os dias estão passando bem rápido, e está bem próximo de a gente chegar a esse dia. A Allana Mariah estão nas mãos de uma equipe que a gente não tem como agradecer”, contou.
Os pais de Allana e Mariah são de Piquerobi (SP). O caso delas é acompanhado no HC desde a gestação e o parto das crianças ocorreu no hospital de Ribeirão Preto.
Antes disso, Talita disse que chegou a ser desencorajada de levar a gravidez adiante ao descobrir a malformação.
A anomalia é considerada rara, com registros de um caso no mundo a cada dois milhões de nascimentos, segundo o neurocirurgião Hélio Rubens Machado.
No último sábado, a equipe realizou novas secções de vasos sanguíneos. Desde a primeira cirurgia, os profissionais utilizam tecnologia de ponta para os procedimentos.
Eles contam com exames clínicos, laboratoriais e de imagem de ressonância magnética e tomografia computadorizada integrados em sistema de realidade virtual.